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terça-feira, 15 de abril de 2008

A minha criada, a minha mãe…

Nasci em Macau, naqueles tempos em que tudo parecia calmo, tudo parecia fácil…Como muitos macaenses e portugueses que lá viviam naquela altura, as criadas chinesas eram imprescindíveis, as mães, as senhoras das famílias eram tipo as “comandantes” e as criadas é que faziam, inclusivamente criar os filhos das famílias.

Por sorte, ou azar, a minha ama era muito boa, já tinha tomado conta de dois dos meus irmãos, já estava em casa da família, há mais de 30 anos, segundo o que ela me contava. Era budista, tinha um terço com qual eu brincava, neste terço em vez de cruz tinha uma cabacinha pequenina, com uma imagem de Buda dentro, onde eu espreitava sempre.

Aprendi a falar com ela, a minha primeira língua foi o cantonense. Lembro tão bem dos dias passados com ela, eram dias divertidos, ela tinha uma paciência que nem as mães tinham, nunca me bateu. Levava-me para todos os lados, para o Jardim Macaco que agora é conhecido como o Jardim da Flora, para casa das amigas que também tomavam conta de crianças como eu, para templos chineses e até ao cinema, sim, ao cinema, lembro tão bem de ver filmes carregados de comunismo chinês, era muito colorido, era muito bonito, cantavam e dançavam num mundo idealizado, perfeito.

Naquela altura, ela já deveria ter uns setenta anos mas era muito vivaça, tinha a testa muito alta, tal como todas as criadas deveriam ter, ia muitas vezes com ela á ´ esteticista ´ que era qualquer sítio montado na rua, a senhora punha-lhe pó na cabeça e com uma linha enrolada nos dedos tirava-lhe todos os pelos, cabelos numa facilidade que só visto. Também havia aquelas amigas dela que fumavam cachimbo de água, eu fica a ver muito entusiasmada, era um cachimbo feito de bambu enorme eu deitava imenso fumo e elas inalavam.

Quando comecei a ir para escola, talvez com uns cinco anos, ela tinha que sentar comigo dentro da sala de aula, pois eu não conseguia ficar longe dela, era como se me faltava qualquer coisa, chorava que nem uma Maria Madalena.

Lembro-me do dia em chego a casa, já não me lembro para onde tinha ido, e procuro por ela, a minha mãe diz-me que ela tinha-se ido embora, para o templo de Hong Kong, o templo que ela me dizia muitas vezes que havia de ir quando ficasse velhinha, era tipo um lar. Chorei, esperneei, senti-me abandonada, nada me alegrava e nem sequer conseguia dormir á noite porque ela já não estava ao meu lado, Sei que tudo foi planeado para ela ir-se embora sem eu ver, talvez tenha sido o dia mais triste da minha vida, tinha eu oito anos.

Cresci normalmente, a relação com a minha mãe nunca foi pacifica, nunca fomos grandes amigas, com o meu pai era diferente.

Penso que os laços que se criam nos primeiros anos da vida das crianças são cruciais, para mim ela era a minha mãe. Os contactos mantiveram-se, falava com ela ao telefone de vez enquando, entretanto vieram os anos de adolescência e a entrada na vida adulta, tivemos poucos contactos, nessa altura havia coisas que pensava que eram mais importantes para fazer.

Casei-me, tive os meus filhos e jurei para mim mesma que os meus filhos nunca teriam amas na vida, sou e serei sempre eu a mãe deles, a cuidar deles e nunca os deixarei abandonados.

Muitas vezes penso nela, das saudades que tenho dela, em como não a visitei quando deveria ter feito, de ter estado mais com ela na sua velhice, de lhe ter dito que me fez muita falta, gostaria te lhe der dito que a amava muito e de lhe agradecer por tudo.

Uma beijinhos para a minha ´mãe´ e obrigado por teres feito parte da minha vida.

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